Prisões de Robinho e Daniel Alves levantam discussão sobre os direitos das mulheres
As prisões por estupro de Robinho e de Daniel Alves, ex-jogadores da Seleção Brasileira de Futebol masculina, levantou um debate bastante intenso na sociedade e, em especial nas redes sociais, a respeito dos direitos das mulheres contra o machismo, a misoginia, as condições de trabalho e a vulnerabilidade delas em face aos alicerces patriarcais que permeiam a sociedade brasileira desde sempre.
Apesar dos avanços obtidos nas últimas décadas, principalmente após a sanção, em 2006, da Lei nº. 11.340, conhecida popularmente como Lei Maria da Penha, ainda há mulheres que desconhecem a abrangência dos seus direitos como cidadãs, e em especial como partícipe da construção social por igualdade em relação aos homens.
Por incrível que pareça, é por desconhecer a amplitude desses direitos que não são raros os exemplos de mulheres que defendem aspectos estruturais do machismo, como por exemplo retirar queixas contra os seus agressores, seja por questões de dependência financeira do parceiro, pela imposição religiosa, ou simplesmente por não conseguirem acessar o compêndio de direitos devido à ausência de uma assessoria jurídica especializada.
Neste sentido, foi justamente para suprir a imensa demanda por igualdade de gênero, e de apoio às mulheres vítimas de violência, que o município de Itapira deu um grande exemplo para a região, ao inaugurar o CREM (Centro de Referência Especializado da Mulher), em 2021.
O CREM é um órgão inserido no organograma da Secretaria de Promoção Social, da Prefeitura Municipal, que tem como objetivo contribuir para a diminuição das ações de indiferença nas questões de desigualdades de gênero, que acabam por reforçar a cultura da violência contra o feminino.
Uma das idealizadores do CREM, a advogada Vivian Nicolai, conclui que o desconhecimento sobre os seus direitos é que faz com que algumas mulheres tenham uma postura considerada misógina ou pró-homem, estritamente relacionada com as condições patriarcais e machistas da sociedade brasileira.
No entanto, esta lacuna aos poucos vem sendo demovida.
“Desde que o CREM fora inaugurado, percebemos um grande avanço do empoderamento feminino itapirense em relação aos seus direitos, principalmente o acesso às garantias que as leis, e o sistema de Justiça, podem conferir a elas, em especial com o amparo legal da Lei Maria da Penha”, observa Vivian. “Com a Maria da Penha, as mulheres obtiveram um respaldo enorme para suas demandas por igualdade e a proteção pelo Estado”, esclareceu advogada.
O CREM oferece um atendimento humanizado e acolhedor, sendo uma referência para as itapirenses quando o assunto é violência, sem dúvida alguma. Tanto é que o Centro já realizou mais de mil atendimentos desde o início das atividades. “O que demonstra um grande avanço, e uma conquista enorme para as mulheres da nossa cidade”, afirmou Vivian Nicolai.
Em o artigo lúcido, publicado na edição eletrônica do Brasil de Fato, a advogada paranaense Ketline Lu insere os direitos das mulheres no âmbito maior dos Direitos Humanos, qualificando-os como valores éticos de respeito à vida e à dignidade humana
“Em relação à proteção às mulheres, o sistema da ONU percebeu que somente a proteção geral e abstrata não seria suficiente para proteger as mulheres, e em 1946 criou uma Comissão sobre a condição da mulher substituindo a expressão “direitos do homem” por “direitos da humanidade”, menciona Ketline.
Conforme descreve a advogada paranaense, “o sistema de proteção dos direitos humanos inscreveu a questão da igualdade entre homens e mulheres como condição para a justiça social, reconhecendo que a violência contra mulher a priva de sua vida, de possibilidades de desenvolvimento de suas capacidades na educação e no trabalho, condenando-a a um futuro de dependência e submissão aos homens”, salienta.
Mas, o que acham as entrevistadas por A Gazeta sobre os seus direitos como mulheres? Houve avanço ou não?
Para Milena de Cássia Garcia, auxiliar de apontamentos, muito já se avançou em termos do reconhecimento dos direitos das mulheres, mas que ainda há discriminação contra elas em diversas esferas, principalmente quando se referem às competências profissionais comparadas às dos homens.
“A impressão que dá é que não acreditam na nossa capacidade profissional ou como ser humano. Temos que provar duas vezes mais do que os homens que somos competentes”, declarou.
A comerciária Kátia de Souza Arruda, por sua vez, menciona que progressos aconteceram na sociedade, porém, ainda há muito o quê “caminhar e fazer” em direção à igualdade de gêneros.
“Nossos salários são menores do que os dos homens para os mesmos cargos. E temos menores chances de conseguir oportunidade profissionais vantajosas por conta da discriminação”, comentou a moça.
A promotora de Justiça de Itapira, Patrícia Taliatelli Barsottini, também concorda que há muito por fazer para que a sociedade, como um todo, reconheça os direitos das mulheres como algo que promova a igualdade e a justiça social.
Contudo, ela vê avanços palpáveis em diversos segmentos, dentre eles o que concerne ao serviço público.
“Há um avanço bem nítido, com adoção de medidas assertivas, na esfera pública quanto à igualdade de mulheres e homens”, confirma, especialmente em concursos públicos, em que, normalmente, não há discriminação entre eles. “Mas vejo progresso tímido na esfera privada”, esclareceu a Promotora.
Para a Dra. Patrícia, o Estado deve realizar um planejamento, com conjunto de ações, que fomentem políticas públicas com o objetivo de diminuir as desigualdades de gênero.
“Somente assim é que devemos ter condições reais de atender as mulheres nas suas necessidades mais urgentes, conferindo a ela qualidade de vida, proteção e apoio”, destaca a promotora.
No âmbito familiar, Dra. Patrícia avalia que ainda hoje a mulher é a parte mais sobrecarregada da casa, pois ela é a responsável por cuidar do lar e dos filhos, no mais das vezes, havendo pouca colaboração masculina, pese se observar uma mudança, pequena, nesse aspecto, e ainda ajuda no sustento da casa, quando não é sua única provedora. Então, no setor privado, há uma certa resistência, hoje muito menor, na contratação de mulheres, com a crença de que elas, diante das exigências familiares, tenham demandas familiares que acabariam por prejudicar dedicação ao trabalho formal.
Ressaltou a necessidade de haver amparo às mulheres vítimas de violência. Muitas delas, após o ato de violência, acabam reatando com o agressor e solicitando a revogação das medidas protetivas de urgência, por estarem inseridas no ciclo da violência e não terem o apoio psicológico e a independência financeira necessários para se libertar dele.
“A mulher que está inserida no ciclo da violência doméstica é muito vulnerável e temos de ampará-la; há necessidade de apoio estatal para que ela consiga se reestruturar psicologicamente, financeiramente e conseguir enxergar o que vem ocorrendo com ela e com seu relacionamento e efetivamente quebrar esse ciclo e deixar de acreditar que esses atos violentos, tanto morais, quanto físicos e patrimoniais seja algo normal”, finaliza.