Política e religião: quem ganha, quem perde!, por Nino Marcati
A relação entre política e religião é uma questão intricada, mas é importante questionar quem se beneficia nessa união. Abordar esse tema muitas vezes é complexo e nem sempre conduz a discussões racionais.
Estamos nos aproximando da Páscoa em um ano de eleições municipais, o que considero ser um momento oportuno para refletir. Segundo o relato bíblico, foi durante essa época que Pilatos, diante da pressão das autoridades judaicas para condenar Jesus à morte, lavou simbolicamente as mãos, fugindo assim da responsabilidade que lhe cabia como governador romano na Judéia, deixando a decisão nas mãos dos líderes religiosos e da multidão dividida presente. Esse gesto, do ponto de vista político, pode ser interpretado como uma separação entre Estado e Religião. O desfecho é conhecido, Jesus foi crucificado, atendendo à vontade daquela maioria. Repare, não foi uma decisão religiosa, mas política. A ideia era que Jesus saísse de circulação.
No Brasil, a Constituição do Império de 1824 estabeleceu o catolicismo como religião oficial e dominante. Durante o período colonial e imperial, a Igreja Católica exerceu controle político e social sobre o país, influenciando políticas públicas, educação e moralidade, muitas vezes interferindo nos assuntos de Estado. A oficialização da separação entre Igreja e Estado ocorreu em 1890, por decreto, e foi confirmada pela Constituição de 1891. Passamos a ser e somos até hoje uma nação laica.
Apesar do distanciamento constitucional, os poderes executivos, legislativos e judiciários continuaram a utilizar símbolos religiosos, como o crucifixo, e práticas como juramentos sobre a Bíblia persistiram. Isso levanta a questão: quem se beneficia com o uso de símbolos ou textos religiosos na esfera política e judiciária? Após mais de 130 anos dessas práticas, que impacto positivo teve na qualidade de nossa classe política e judiciária?
É difícil afirmar que os políticos agem sempre de acordo com os princípios cristãos, apesar de seus vínculos religiosos ou dos símbolos cristãos aparentes. Será que eles utilizam o relacionamento com as igrejas apenas para serem eleitos e, depois, para acobertarem seus eventuais erros? Será que os políticos não vinculados às igrejas usam os símbolos para chancelarem as consequências do que foi decidido? As decisões políticas tomadas diante de símbolos religiosos ou textos bíblicos consideram verdadeiramente a palavra de Deus? A persistência da desigualdade social, a fome e as injustiças contradizem a visão idealizada pelas religiões.
Pode-se especular que, se Jesus voltasse para verificar a situação atual do Brasil, ele teria uma atitude semelhante à que teve no Templo de Jerusalém. Depois de expurgar todo e qualquer vínculo, Ele certamente diria algo assim: “onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali eu estarei. Na maioria das decisões que vocês tomaram, eu estava presente? Vocês me ouviram? Pois bem, não quero me intrometer, tomem as decisões que bem entenderem de acordo com a consciência de vocês, mas não me coloquem nisso.”
Pelo andar da carruagem, só a religião pode sair perdendo. Ou não?
Nino Marcati