Artigo: Acabou a gasolina, por Humberto Butti
No final da década de 80 Itapira era uma cidade que respirava esporte. Eram muitas competições e muitas delas com projeção nacional, como a Minimaratona Professor Cândido de Moura, que reunia atletas de várias partes do país.
O trabalho efetuado pela equipe do DECET (Departamento de Esportes, Cultura e Turismo), comandado pelo professor Oscar Soares de Campos Filho, o Kally, era reconhecido de forma merecida e colocava a cidade nas altas esferas do jornalismo esportivo. E o ponto culminante, sem dúvida, era a famosa corrida de 21 quilômetros, que mesclava em seu percurso trechos de terra com ruas da cidade, até adentrar o estádio municipal Chico Vieira, local da chegada.
Naquela época eu comandava a equipe de esportes da Rádio Clube e a cada ano montávamos um esquema para transmitir a prova do início ao fim. Era trabalhoso, mas muito gratificante.
Tínhamos o apoio da prefeitura, que cedia um Fusca com aparelho de rádio amador para que a prova fosse acompanhada em todo o trajeto. Para que isso fosse possível, uma base era instalada no almoxarifado da prefeitura, onde ficava a torre de recepção do serviço de rádio.
Com a destreza do Jorge Luís Bonaldo, o som que chegava na torre era retransmitido para o estúdio e de lá para nossa transmissão. E assim tudo que se passava no trajeto era relatado.
Não me recordo o ano, mas lembro que o carro era dirigido pelo meu pai, que ao seu lado tinha o Tuia Pires de Souza, que narrava a prova e no banco de trás o Ademar Hernandes, que carregava a listagem com os atletas, para auxiliar na narração. E assim era possível para o ouvinte saber quem estava na frente e a posição dos demais competidores.
No estádio ainda tínhamos três repórteres no gramado. Lá estavam Léo Santos, Glauco Lauri e Humberto Luchetti, enquanto eu ocupava a cabine do estádio para narrar a volta final e a chegada e tinha no plantão, no estúdio da emissora, o José Roberto Destro, acompanhando e informando os resultados dos jogos daquela tarde de sábado.
Tudo corrida dentro do planejado, até que veio a informação que poderia acabar com todo o trabalho. Segundo o Tuia o carro apresentava problemas e estava ficando para trás enquanto os competidores seguiam na prova.
Nossa sorte foi a presença dos três repórteres, que passaram a entrevistar quem quer que fosse até que o problema fosse resolvido. Mas o tempo passava e nada de o carro ficar bom de novo, até que tudo se normalizou e novamente a transmissão pode continuar até que os primeiros colocados surgissem no portão do estádio e eu passasse a narrar os metros finais.
Mais tarde, já com o trabalho encerrado e satisfeitos com o sucesso, meu pai, o Tuia e o Ademarzinho já conosco no estádio, que fiquei sabendo o ocorrido. O carro que tinha sido destinado para nosso trabalho não tinha sido abastecido e a gasolina acabou no meio do percurso.
Passado o susto e agradecidos pelo sucesso da transmissão, só nos restou sentar no Chopinho e comemorar nossa vitória. O vencedor da prova? Confesso que não lembro quem foi, mas naquele instante nada importava, somente o fato de termos concluído mais uma façanha nas ondas do rádio.
*Humberto Butti é escritor e jornalista, autor dos livros O Menino Magricela de Orelhas Grandes, Passagens e Personagens da Vida e Os Melhores Anos de Nossas Vidas (em fase final)