Gazeta Itapirense

Crônica: Largado na cama da Julinha, por Rodrigo Alves de Carvalho

Matéria exclusiva com nosso repórter Adalberto, que está diretamente na casa da Julinha. Vai daí Adalberto!

— É isso mesmo, estamos aqui no quarto da Julinha, onde o seu celular foi largado em cima da cama e agora está desesperado, chorando copiosamente. Vamos saber o que aconteceu com esse celular.

— A Julinha me deixou aqui sozinho!

— Calma lá celular. Vamos começar do começo. Como era seu relacionamento com a jovem em questão?

— Era a melhor possível. Desde quando ela me escolheu na loja de celulares alguns anos atrás, nos apaixonamos e em pouco tempo eu já controlava sua vida.

— Como assim? Controlava a vida da Julinha?

— Sim. Como todo celular que se preze, eu tinha forte influência sobre a menina. Sua vida girava em torno de mim. Ela não largava de seu amado celular nem para dormir.

— Por favor explique isso direito?

— No dia a dia, quando acordava, durante as madrugadas, na escola, nas ruas, em todo lugar minha querida Julinha não desgrudava de mim. Passou a viver praticamente sob minha função. Sabia de tudo o que acontecia com os amigos graças a mim, conversava com outras pessoas a qualquer momento, olhava fotos das paquerinhas, postava milhares de selfies em todos lugares e até pratos de comida que iria devorar. Todos os afazeres de seu dia eram em torno de mim, que controlava sua vida por completo e ela era apenas uma submissa, hipnotizada pela minha tela brilhante e fascinante. Seus dedos longos e delicados me acariciavam e a cada toque ela se deslumbrava com essa minha atração que a contagiava, sem se dar conta de ter a vida sugada.

— Mas o que aconteceu? Por que essa choradeira agora?

— De umas semanas para cá, percebi que a Julinha começou a agir estranho comigo. Passou a me evitar durante as refeições e à noite não me coloca na cabeceira da cama. Chegou ao cúmulo de me deixar em seu bolso uma tarde inteira e me ignorou por completo. E nesta noite! Ah! Como eu sofro! Ela simplesmente me deixou aqui, jogado e esquecido enquanto saiu com os amigos para a balada!

— E você sabe por quê?

— Diz ela que quer viver a vida. Conhecer pessoas de verdade, sair, passear e ser feliz! Olha que absurdo seu Adalberto! Isso é coisa que se faça com um pobre celular?

Rodrigo Alves de Carvalho nasceu em Jacutinga (MG). Jornalista, escritor e poeta possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2022 relançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores, disponível na Amazon, Americanas.com, Estante Virtual e Submarino.

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